Conheci Leonor Seabra no final do ano 1992 em Banguecoque. O motivo que a trouxera à capital tailandesa era o procurar nos arquivos velhos da Embaixada se por lá haveria, algo, que lhe servisse para levar a bom porto as investigações, históricas em cima das Relações do Sião e Macau e, óbviamente de Portugal que se propuzera levar a cabo.
Não vou aqui referir os entraves que a historiadora encontrou quando revelou os seus propósitos, aos responsáveis pelo pelouro da Cultura da Embaixada de Portugal em Banguecoque que acabou por não lhe ter sido facilitado acesso (até porque ali já não existiam) aos “calhamaços” com ou sem valor histórico que lhe servissem de matéria informativa.
Bem é que a Feitoria, e depois o Consulado de Portugal, os Cônsules nomeados, por fraco acondicionamento, desleixo e, também, pela qualidade pobre do papel que absorvia a humidade, que, constantemente, pairava na atmosfera de Banguecoque, levou essa preciosa informação se fosse perdendo através de anos.
Mas a Feitoria e o Consulado por umas vezes estava sob a jurisdição de Macau e outras por Goa. Ficaram assim (aqueles que não se perderam como nos arquivos de Banguecoque) a documentação histórica dispersa nos arquivos dos dois antigos territórios administrados por Portugal.
Os documentos existente nos arquivos da Torre do Tombo ou nos do Palácio das Necessidades, pelo conhecimento que temos, é escasso.
Procurei ajudar, no que pude, Leonor Seabra e facilitando-lhe a minha biblioteca e cópias do material que lhe pudesse ser útil.
Na minha qualidade de sócio, fomos à prestigiada - e a maior de toda a Ásia, em cultura e arquivos históricos - “Siam Society” em Banguecoque.
Viajámos até Ayuthaya para lhe indicar aonde os portugueses se instalaram, no Bangueportuguete (Aldeia dos Portugueses) depois de 1516 até 1767, quando Ayuthaya caíu; as ruínas dos fortins junto às margens do rios: Chao Praiá, Lopburi, Pasak e, também, nos templos budistas, para os proteger das investidas militares, do Reino do Pegú. Fortins com as ameias lusas que felizmente estão bem conservados e por séculos ali se encontram a lembrar um passado que bem honra Portugal.
Leonor Seabra regressou a Macau, com cerca de um milhar de cópias, com material que lhe poderia servir (todo historiador ou escritor/a quer trazer, com determinção, à realidade a obra que planeou e sonhou), para os seus a elaboração dos seus excelentes e valiosos documentos históricos, da era da expansão portuguesa no Oriente, que ficarão e poderão ser obras valiosas para os interessados, presentes e futuros investigadores, da “Epopeia Portuguesa” na era dos Descobrimentos.
Nunca mais me encontrei pessoalmente com a ilustre historiadora.
Mas não é importante vermo-nos, em pessoa, porque todos os anos Leonor Seabra nunca deixou de me enviar as felicitações do Ano Novo Cristão e do Ano Novo Chinês e enviar umas “patacas” para a minha filha Maria comprar um presentito, a quem conheceu uma “pequenita” de uns cinco anos e de quem nunca me deixou de falar dela, nessas comunicações durante as quadras festivas de fraternidade e amizade.
Quem meus filhos beija meu coração abraça!
Leonor Seabra ficou na lista dos meus bons amigos, dos tantos com quem me relacionei durante a longa permanência que já levo na Tailândia.
José Martins
CURRICULUM
Isabel Leonor da Silva Diaz de Seabra nasceu em Lisboa, mas viveu em África (Angola, Guiné e Moçambique) e, depois, em Portugal (cerca de 10 anos), antes de vir para Macau (em 1987).
É professora efectiva do Ensino Secondário (em Portugal); em Macau, trabalhou no Instituto Cultural (na área de investigação, entre outras) e, presentemente, é assistente do departamento de Português da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade de Macau.
Participou em seminários, colóquios, etc, nalguns dos quais apresentou comunicações, e tem diversos trabalhos de investigação publicados em revistas da especialidade.
HABILITAÇÕE LITERÁRIAS
- Licenciatura em HISTÓRIA, pela Faculdade de Letras da Universidade
do Porto ( pré-especialização: Época Moderna).
- MESTRADO em Estudos Luso-Asiáticos (variante de HISTÓRIA), Instituto de Estudos Portugueses da Universidade de Macau com uma tese sobre “ As Relações de Macau com o Sião”.
DOUTORANDA na Faculdade de Letras da Universidade do Porto, desde 2002, com uma tese subordinada ao tema: “ A MISERICÓRDIA DE MACAU: SOCIEDADE, PODER E CARIDADE”:
- lseabra@macau.ctm.net ldseabra@hotmail.com
Editado pelo Centro de Publicações da Universidade de Macau/2003
PALAVRAS INTRODUTÓRIAS
Os Portugueses foram os primeiros europeus a chegar ao Sião, logo nos primeiros anos do século XVI, após a conquista de Malaca por Afonso de Albuquerque então, durante séculos mantiveram relações priviligiadas com essa potência asiática, comprando a vendendo os mais variados produtos, é certo, mas também intercambiando ideias técnicas, prestando os mais diversos serviços, sobretudo de tipo diplomático e militar, e difundindo o Cristianismo. Como resultado deste relacionamento intenso, desde cedo apareceram em alguns portos do Sião pequenas comunidades luso-siamesas, que recebiam tratamento diferencial da parte dos governantes locais.
Ãpesar do relacionamento entre o Sião e os Portugueses ter sido intenso e tão duradoiro, sobre ele não abundam estudos históricos e documentados. Não por escassez de documentação, já que nos arquivos de Lisboa, de Goa e de Macau, se conservam numerosos testemunhos da histórica ligação entre Portugal, Macau e o Sião. Mas antes por falta de investigações interessados capazes e, também, por falta de programas de investigação sistematizados e abrangentes. Com efeito, apesar de, nos últimos anos, o panorama da investigação sobre a presença portuguesa na Ásia Oriental ter sofrido alterações verdadeiramente espectaculares, com a produção de numerosos estudos originais e com a divulgação sistemática de fundos de arquivos e bibliotecas, os historiadores portugueses não se têm abalançado, com a necessária assiduidade, na edição das muitas fontes documentais ainda inéditas. Talvez porque a publicação de fontes históricas é um trabalho moroso, que exige grande disciplina, pois não são imediatos e mdiáticos os resultados através dele obtidos.
Por isso mesmo, maior mérito adquire o trabalho de Isabem Leonor de Seabra sobre a embaixada enviada de Macau ao sião, em 1684, e chefiada por Pero Vaz de Siqueira. Em trabalho anteriormente publicado, Relações entre Macau e o Sião (Séculos XVIII-XIX, Macau, Universidade de Macau, 1999), resultado de uma uma brilhante dissertação de mestrado apresentado à Universidade de Macau, esta investigadora revelara já o seu domínio seguro de uma temática bem pouco explorada pela historiografia portuguesa (e internacional).
Perante o trabalho de investigação então desenvolvido, Isabel Leonor de Seabra localizou no Historical Archives of Goa, em Pangim, a importante relação da embaixada ao Sião de Pero Vaz de Siqueira, que se encontrava inédita, como tantos outros documentos, fundamentais para o conecimento das vicissitudes da presença portuguesa na Ásia, ainda o estão. É esse importantíssimo documento que esta investigadora agora publica, em edição crítica, contextualizada por textos introdutórios e devidamente anotada.
O documento agora posto à disposição dos leitores contém notícias importantissímas, não só sobre as relações diplomáticas e económicas que se desenvolveram entre Macau e o Sião, mas também sobre inúmeros aspectos da realidade siamesa seiscentista.
História da presença portuguesa na Ásia Oriental, concretamente as relações entre Assim, particular importância assume o trabalho agora concluído de Isabel Leonor de Seabra, pelo facto de fornecer elementos inéditos, e de um enorme valor documental para o estudo das relações luso-siamesas, que desde cedo passaram obrigatoriamente por Macau. Será agora possivel conhecer com maior profundidade e rigor, não só a conjuntura macaense no século XVII, mas também os mais importantes aspectos económicos e diplomáticos do relacionamento português com o Sião, bem como os respectivos reflexos na vida de Macau.
O trabalho em apreço destaca-se não só pelo facto de Leonor Seabra ter trazido à luz do dia os extensos e valiosos documentos luso-asiáticos, que corriam sérios riscos de desaparecimento, mas também pela circunstância de o ter contextualizado, como auxílio de uma amplíssima e actualizadíssima bibliografia especializada, muita dela em línguas estrangeiras, bem como através do recurso a um vasto leque de documentos inéditos, que são devidamente aproveitados na construção de um estudo rigoroso e inovador.
A autora está de parabéns por esta magnifica edição, que vem renovar o conhecimento de uma das áreas e de uma das épocas menos trabalhadas da Macau e o Sião no corfrer da centúria de seiscentos.
A Universidade de Macau, entretanto, estará de parabéns, caso decida trazer a público uma das mais importantes investigações elaboradas no âmbito do seu Departamento de Português da Faculdade de Ciências Sociais e Humanas. Em Portugal, muitos e valiosos trabalhos produzidos no âmbito de actividades universitárias, por falta de politicas académicas e editoriais consequentes, costumam ficar enterrados nos arquivos. É bom saber que o mesmo não está a suceder em Macau, E é encorajador saber que as autoridades académicas de Macau entenderam que uma Universidade é responsável não só pela transmissão do conhecimento, mas também pela sua produção e posterior difusão pública.
Rui Manuel Loureiro
Nota Prévia
Aquando da investigação para a minha tese de mestrado, apresentada à Universidade de Macau, em 1995, encontrei um códice do Historical Archives of Goa, que continha uma série de documentos relativos a uma embaixada enviada de Macau ao Sião, que se revelaram do maior interesse e que me despertaram a curiosidade e a vontade de trabalhar esse manuscrito com maior profundidade. Por condicionalismos vários, não me foi possível fazê-lo mais cedo, mas, em Setembro de 2000, apresentei um projecto de investigação à Universidade de Macau, o qual foi aprovado no Research Committee. É, pois, este trabalho o resultado desse projecto e dessa investigação efectuada durante um ano, quer em Macau quer em Goa.
Este manuscrito, relativo à Embaixada de Pero Vaz de Siqueira ao Sião, pertence ao núcleo Monções do reino, existente no Historical Archives of Goa, mas , como grande parte da documentação deste Archivo, está em muito más condições de conservação. Alguns destes documentos encontram-se na Filomteca Ultramarina Portuguesa, em microfilmes, muitos também de difícil leitura. Por isso mesmo, não quero deixar de manifestar os meus agradecimentos ao Mestre Fernando Calapez Correia, pelo precioso auxílio prestado na transcrição do manuscrito.
Não posso, também, deixar de agradecer ao director do Arquivo de Goa, Dr. Shanakar K. Mhamai, pela amabilidade com que me recebeu. Aos amigos que, em Pangim, tanto apoio me deram e tantas atenções me dispensaram, nomeadamente o Sr. Newton Carvalho e esposa, assim como a restante família.
Ao Prof. Rui Loureiro, pela pronta resposta e ajuda prestada, sempre que lhe manifestei as minhas dúvidas e dificuldades, tendo sido, na prática, o orientador do trabalho.
E, como os últimos são os primeiros, ao meu marido, Adelino Rodrigues Dias, que, como sempre, me deu uma preciosa ajuda, com os seus conhecimentos de informática, na organização do trabalho, arrumação do texto, paginação etc.
E, assim, o trabalho possível, dadas as limitações existentes.
Edição: Centro de Publiçações,
Universidade de Macau/2000
Nota Prévia
Este estudo corresponde a uma dissertação de Mestrado apresentada na Universidade de Macau., em 1994, para conclusão do curso de mestrado em estudos Luso-Ásiático (variante de História), as provas públicas decorreram a 24 de Maio do ano seguinte.
O texto agora apresentado segue a versão inicial, embora com algumas alterações posteriormente introduzidas, no sentido de aperfeiçoar o referido trabalho.
Mais uma vez, reitero os meus agradecimentos, quer a professores e instituições, que me ajudaram a levar a bom termo este trabalho, que a amigos e familiares, por me terem dado todo o apoio necessário á prossecuçaõ do mesmo.
Bem hajam!
Edição da Sociedade de Geografia/1999 - Sociedade de Geografia/1999
Revista de Cultura. Instituto Cultural do Governo da R.A.E. de Macau-Abril 2003
Macau a China e o Japão – Uma Relação Histórica – Séculos XVI-XVII é um excelente e valioso documento, histórico, o artigo de Leonor Seabra inserido na melhor publicação, de todo o mundo lusófono sobre a matéria da expansão portuguesa e relacionamento com os países da Ásia e que desde há vários anos tem vindo a ser editada e, periódicamente, nas línguas chinesa,portuguesa e inglesa a Revista de Cultura de Macau; em 15 páginas e primorasamente ilustrado com um mapa da rota de Goa a Nagasáqui e pinturas depois do séc. XVII.
Dada a extensão do documento passamos a transcrever algumas passagens:
“Ora, mesmo antes da “descoberta” do Japão, em 1543, já deveriam existir relações entre os portugueses e os japoneses, em encontros clandestinos na ilhas ou no mar, ao longo da costa da China Central. Assim, dispondo os portugueses de um porto fixo na costa, em Liampó, passaram a invernar nele, de onde provinham, na maior parte, os juncos. A partir da chegada dos portugueses ao Japão, em barcos desviados por um temporal com gente instalada naquelas ilhas da China, passou ali a ser um centro comercial que imediatamente se valorizou.
Desde os primeiros contactos directos, o Japão fixara-se na mente dos portugueses da época como o país da prata. Em troca dela, a preço baixo, os portugueses levavam ao Japão, em comércio legal, a seda da China, altamente apreciada e que atingia valores elevadíssimos, aproveitando-se da inexistência de navegações oficiais. A sua charneira eram as ilhas de Cantão e, mais tarde, Macau.
Macau era essencialmente uma comunidade comercial, mas a sua situação, no ciclo económico e na conjuntura política, tormou-o um centro de actividade internacional – China e Japão – e nacional, na complexidade das relações das duas potência ibéricas, com interesses opostos mas unidas na pessoa do mesmo soberano: a Espanha e Portugal; as Índias Orientais e as Ocidentais; Goa-Manila-Malaca”.
“No dizer de V.M. Godinho, a China “era o sorvedoro da prata mundial”. A porta de entrada que o Ocidente tem para o império, que a sorve, é Macau. A Cidade de Nome de Deus aflui pela Rota do Cabo, Goa e Malaca, e também pelo Pacífico, via Manila, depois de 1565”.
Edição do Centro de Publicações, Universidade de Macau
No Dicionário de História de Macau (contributos) Leonor Seabra insere um artigo onde descreve apanorâmica do que foram uma poucas grandezas a que se seguem, depois, as pobrezas, relativas ao relacionamento comercial e consequentemente o político entre o Sião e Portugal. A historiadora traz à luz do dia, factos reais e passados durante o reinado de Rama II (1809-1824) em que o fortalecimento das relações entre Portugal e o Sião foi um facto. Estas se viriam a deteriorar-se e, que na minha forma de análise e, assim o escreve Leonor Seabra, estas teriam sido obra e intriga do representante, diplomático, inglês pelo facto de Rama II ter concedido um terreno, a Portugal, para construir Feitoria, residência para o Cônsul e estaleiro para construir e reparar navios.
Passagens de artigos:
Estabelecimento do Consulado e Feitoria. Durante o reinado do Rei Rama II (1809-1824), o contacto entre o Sião e Portugal – nomedamente Macau – fortaleceu-se e a amizade entre os dois países também. Em 1816, foi enviado um navio ao Sião, com cartas do Ouvidor de Macau, Miguel Brum da Silveira, pedindo o reatar das relações comerciais entre as duas cidades. Em 1819, foi de Macau ao Sião, Carlos Manuel da Silveira, como deputado para tratar deste assunto. E, em 1820, foi o mesmo nomeado, pelo Vice-Rei de Goa, cônsul-geral e feitor da Feitoria Portuguesa em Banguecoque. Tendo recebido um terreno para a Feitoria começaram as negociações para o tratado entre Portugal e Sião, o qual nunca chegou a concretizar-se. Para uns, por culpa do próprio Silveira, devido às suas relações com o Praklang (Barcalão) e o príncipe Cromachiet – que mais tarde seria o Rei Rama III; para outros, no entanto, teriam sido os ingleses que, pretendendo a concessão de uma feitoria, ter-se-iam servido de todos os meios para indispor o Rei e seus ministros contra os Portugueses.”
Leonor Seabra conclui: “Tendo em atenção as várias circunstâncias e factores que levaram ao desenvolvimento do interesse dos Portugueses no Sião, pode-se dizer que aqueles que desempenharam um importante papel na aproximação entre os dois povos foram aventureiros, mercenários, mercadores, missionários e moradores de Macau. Foram este que, mesmo após o declínio da presença oficial portuguesa no Extremo Oriente, permaneceram naquele reino com o mesmo espirito, sobrevivendo com êxito e deixando o seu testemunho. Pode também concluir-se que há quase 500 anos de amizade entre Portugal e o Sião, desde os tempos de Ayuthaya, o que não sucede com mais nenhum país europeu, tendo os Portugueses prestado a sua ajuda e influência nas áreas tecnológicas e cultural, ao londo dos tempos.”
E, para finalizar, dentro dos meus conhecimentos sobre o passado histórico de Portugal na Tailândia tenho e, com muito gosto, de elogiar a Obra de Leonor Seabra, não só pela sua investigação pormenorizada e de alto valor, assim como pela subtileza da prosa com que foi escrita, de uma forma que a torna de fácil assimilação aos estudiosos e interessados no relacionamento histórico entre Portugal, Macau e o Reino do Sião.
Portanto, os meus sinceros parabéns!
José Martins
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