Wat Phra Sri Sampetch com toda a sua magnificência de quando os portugueses conheceram o reino do Sião em 1512 (reconstrução, virtual, actual)
Portugal e a Tailândia são duas nações unidas, por laços de amizade, há 497 anos. Portugal foi o primeiro país da Europa a conhecer o Reino de Ayuthaya (depois Reino do Sião).
Depois de Vasco da Gama ter descoberto o Caminho Marítimo para o Oriente, em 1498, o Rei D. Manuel I, desde logo tem nos seus planos a conquista de Malaca. A ilha é banhada pelo Mar de Andaman, ao sul da Baía de Bengala e o maior entreposto comercial de toda a Ásia, onde os reinos do extremo-Oriente e das redondezas chegavam exóticas mercadorias. Entre estas a pimenta, a canela, a pedraria, o cânhamo, o gengibre, o estanho, prata e as porcelanas da China
D. Afonso de Albuquerque
O mercado de Malaca, por séculos, foi absorvido pelos árabes que através das rotas do Golfo Pérsico, Mar Vermelho e depois por terra abasteceram os mercados, tradicionais do Norte de África, Veneza, Piza e Genova em Itália. Empórios que deixaram de ter qualquer significado, mercantil, após os portugueses terem chamado a si o abastecimento das "coisas" da Ásia a toda a Europa.
Dez anos depois da chegada dos portugueses ao Oriente, parte do comércio da Índia já era dominado pela Coroa Portuguesa e bem conhecidas as riquezas de Malaca. Porém falta, apenas, explorar as costas do Coramandel e as da ilha de Ceilão. São úteis e vitais para o bom sucesso da expansão e conquista do comércio oriental todas as informações, sobre os portos e rotas obtitas das tripulações muçulmanas que por inocência ou dinheiro as revelavam. Estavam longe de suspeitar, os muçulmanos, que o objectivo dos portugueses seria arrebatar-lhes o secular, monopólio, do comércio da praça de Malaca.
D. Manuel I vai recebendo, chegadas a Lisboa, as mensagens credíveis dos comandantes das caravelas que navegam de Cochim (Índia) também chamada a "terra da pimenta", da imponência, esplendorosa de Malaca. O Rei Venturoso, sonha, animado pelo espírito do Infante D. Henrique e pretende a todo o custo transformar um Portugal (flagelado pela peste e fome) numa potência económica da Europa.
Em Abril de 1508 uma esquadra naval, sob o comando de Diogo Lopes Soares de Sequeira passa a Barra do Tejo com destino a Malaca. Atraca, primeiro na Ilha de Sumatra, implanta um Padrão na cidade de Pedir, outro em Pecém e a sua frota de naus está ancorada no porto de Malaca no dia 11 de Setembro de 1509.
Sequeira sem fanfarra e o rufar dos tambores de guerra, mas na pele de um mercador para se abastecer de mercadoria e carregar nos porões das naus foi bem recebido. Entretanto a conspiração movimenta-se na sombra. Escapou à morte devido à simpatia que uma muçulmana nutria por ele e proprietária da estalagem que, possivelmente, o comandante português frequentava para obter informações e levar a cabo, com determinação, a conquista de Malaca.
Diogo Lopes Sequeira regressa a Lisboa, sem trazer a boa-nova a D.Manuel I que Malaca já era praça de Portugal. Deixou, pela má sorte, alguns portugueses prisioneiros. Entre os quais está Duarte Fernandes que viria ser o primeiro português a pisar terra siamesa. Fernandes, durante dois anos de detenção, aprendeu a língua malaia, grangeou do Sultão a simpatia que será estendida aos seus companheiros de cárcere. Com isto viria a gozar a total liberdade de movimentação.
Afonso de Albuquerque, finalmente, é o senhor de Goa. O indomável guerreiro e exímio diplomata, prepara uma armada naval e parte para Malaca, com o propósito de a conquistar. Dá-lhe o primeiro assalto em 1511 e arrebata-a. Envia, como emissário, à cidade de Ayuthaya, Duarte Fernandes para informar o Rei do Sião que Malaca tinha sido conquistada. Fernandes é portador de uma espada, e guarnecida de ouro e diamantes incrustados para presentear o monarca siamês. Foi bem acolhido pelo Rei Rama Thibodi II.
O monarca não esconde a sua alegria (embora alguns historiadores escreveram que o monarca siamês não teria ligado grande importância ao feito), pelo facto de Malaca ter saído da posse dos sultões, dado que desde há muitos anos se tinham recusado em ir a Ayuthaya prestar-lhe vassalagem e pagar, em ouro, o tributo anual. Malaca era um pequeno reino tributário do Sião, assim o eram mais doze do Sudeste Asiático onde se incluía Patani. Nenhum destes, monarcas tributários, se houvera recusado à obediência ao Rei do Sião.
A Fortaleza de Malaca e a entrada para " A Famosa"
Duarte Fernandes regressou de de Ayuthaya a Malaca por terra, mar e cursos de água.Navega as primeiras 70 milhas pelo Rio Chao Praiá até à Barra do Sião. Segue, depois, possivelmente à "boleia" num pequeno barco costeiro, umas 300 milhas, até Prachuap Khirikhan. Atravessa a região montanhosa no dorso de elefante e atinge o Rio Tenassarim.
Navega em almadias, faz amizade com os siameses, graças ao conhecimento da língua e chega ao Porto de Mergui. Passado 14 dias de ter deixado Ayuthaya está a dar conta a Afonso de Albuquerque da recepção que lhe concedera Rama Thibodi II. Fernandes, de Ayuthaya, foi acompanhado por um enviado siamês, levando consigo ricos presentes e uma carta para o Rei D.Manuel I.
Vasco da Gama o descobridor do Caminho Marítimo para a Índia
Afonso de Afonso de Albuquerque, homem entrépido, e de uma metodologia impressionante (que vamos encontrar nas suas Carta a El-Rei de Portugal), nos seus cálculos, para firmar o poderia de Portugal na Ásia, não poderia desistir de conquistar Malaca.
Segundo o historiador John Villiers, num artigo seu, publicado na monografia "Portugal e a Tailândia" - Fundação Calouste Gulbenkian 1988 - relata:
" Nessa altura, o reino de Sião ainda reclamava a soberania sobre Malaca e Albuquerque, quando planeava atacar este porto, procurou uma aliança com o rei Rama Thibodi II de Ayuthaya (1491-1529), oferecendo-lhe soberania directa sobre todos os territórios governados pelo sultão de Malaca caso o ataque fosse bem sucedido. Para este efeito, enviou Duarte Fernandes (que viera para Malaca em 1509 como oficial da frota portuguesa comandada por Diogo Lopes Sequeira e que falava um pouco de tailandês) a Ayuthaya, onde lhe foi concedida uma audiência com o Rei Rama Thibodi II, na qual este foi presenteado com uma espada cuja bainha era de ouro incrustada com diamantes.O Rei do Sião, apesar de não manifestar qualquer oposição ao ataque dos portugueses a Malaca, mostrou pouco interesse na proposta da aliança. Deste modo Albuquerque atacou e tomou sózinho a cidade. No entanto, após a conquista, não perdeu tempo a mandar novas embaixadas a Ayuthaya. Em 1512 enviou António Miranda de Azevedo, tendo este permanecido no Sião durante dois anos, regressando a Goa acompanhado de um enviado tailandês portador de uma carta de amizade de Rama Tibodi II para Rei D. Manuel I de Portugal. Em 1516, Duarte Coelho deslocou-se a Ayuthaya como enviado do governador de Malaca, tendo concluído o primeiro tratado de aliança e comércio entre o Sião e Portugal. Nos termos do tratado de 1516, os portugueses acordaram em fornecer armas e munições ao Sião em troca da autorização do estabelecimento de feitorias comerciais em Ayuthaya, Ligor, Patani, Tenassarim e Mergui. Também lhes foi concedida a liberdade de culto religioso e, deste modo, pouco tardou a que construissem uma igreja em Ayuthaya, vindo aí a trabalhar padres missionários. Em comemoração da conclusão do tratado e como marca da possessão de uma nova colónia na capital, Duarte Coelho foi autorizado a erigir um padrão".
O sistema de defesa do Reino do Sião, antes dos portugueses encetarem o relacionamento diplomático, era de certo modo bastante obsoleto e, praticamente, as armas de fogo desconhecidas. Nas batalhas a luta era efectuada de lutas corpo-a-corpo, no terreno, ou no dorso de elefantes. As armas de defesa eram facas, espadas e as pontas de lança forjadas no ferro que recebiam a têmpera para lhes dar resistência.
Representam assim os portugueses um papel importante e primordial na defesa do reino do Sião, ensinando os siameses no manuseamento das armas de fogo, como na arte de as construir.
Coronha de espingarda do século XVI. Arma portuguesa introduzida no reino do Sião após de assinado o primeiro Tratado com Portugal em 1516. (Peça pertencente ao "Museu da Espingarda" em Tanegashima no Japão)
Teriam sido os chineses, antes dos portugueses, introduzirem canhões no Sião, cuja aplicação redondou em fracasso. Quando foram aplicadas em campo de batalha, morreram mais pessoas do lado defensor do que do inimigo.
Mas antes que me aprofunde em outros factos, históricos, é digno de aqui designar as impressões de Duarte Barbosa, reveladas no "Livro em que dá relação do que viu e ouviu no Oriente Duarte Barbosa" relativas ao reino de Anseão (reino do Sião) e sem se referir à data que por lá passou (cerca de 40 anos antes de Fernão Mendes Pinto) e (possivelmente) na altura em que António Miranda de Azevedo oficializou as relações diplomáticas, em 1512, entre Portugal e o Sião. Não está fora de hipótese que o Barbosa tenha estado em Ayuthaya anos antes de Duarte Fernandes, enviado de Afonso de Albuquerque, sondar a opinião do Rei Thibodi II, em cima da conquista de Malaca.
As narrativas de Duarte Barbosa sobre as terras por onde passou, depois do Cabo da Boa Esperança, refere-se ao Cabo de S. Sebastião, às Ilhas Húcicas e Sofala e termina em Champa e Lequeos nas Índias Orientais.
No entanto o itinerário de Duarte Barbosa só veio a ser conhecido, depois de publicado, publicado, em língua portuguesa, em 1812, pela Academia Real de Ciências. Porém o já tinha sido publicado na língua italiana.
Duarte Barbosa prefacia a sua obra:
" Tendo eu, Duarte Barbosa, natural da muito nobre cidade de Lisboa, navegando grande parte da minha mocidade pelas Índias descobertas em nome de el-Rei nosso senhor; e tendo viajado por muitos e vários países vizinhos à costa, e visto e ouvido várias cousas que julguei maravilhosas e estupendas, por nunca terem sido vistas, nem ouvidas por nossos maiores, resolvi-me a escrevê-las para benefício de todos, tais como as vi e ouvi de dia em dia, trabalhando por declarar em este meu Livro os lugares e limites de todos aqueles reinos, aonde estive pessoalmente ou de que tive informações dignas de fé, e, bem assim, quais sejam os reinos e países de mouros, quais os de gentios e os seus costumes. Nem deixarei em silêncio o seu tráfico e as mercadorias que neles se acham, os lugares aonde nascem e para onde se conduzem, e, além do que pessoalmente vi, sempre me deleitei em procurar aos mouros, cristãos e gentios pelos usos e costumes de que eram práticos, cujas informações tomei o trabalho de combinar umas com outras, para ter uma notícia mais exacta delas, que foi sempre o meu principal intento, como deve ser o de todos os que escrevem sobre semelhantes matérias, e persuado-me se conhecerá que não poupei diligência alguma para conseguir este fim, quando o permitem as débeis forças do meu engenho. E foi no presente ano de 1516 que acabei de escrever este meu Livro".
Estamos perante um cronista, quinhentista, honesto que relata apenas aquilo que os seus olhos vêem e vai tomando nota das informações, que vai recolhendo e lhe merecem crédito.
Não deixa de nos impressionar, a veracidade, com que Duarte Barbosa relata o Reino de Anseão (Reino do Sião). Fernão Mendes Pinto que residiu no Sião por cerca de meia dúzia de anos não se distancia nos seus relatos (daquilo que o Barbosa observou no Sião havia, já, 40 anos) na sua Obra a "Peregrinação".
O que nos diz Duarte Barbosa:
REINO DE ANSEÃO
"Indo mais ao diante, deixando o reino do Pegú, ao longo da costa contra Malaca, está um mui grande reino que chamam de Anseão, de gentios.
O rei dele o é também, e mui gram senhor; toma desta costa até à outra que de Malaca vai contra a China, de maneira que de ambas as bandas tem portos de mar. É senhor de muita gente de pé e de cavalo, e de muitos elefantes. Não consente que em sua terra os mouros tragam armas.
Logo saindo do reino do Pegú, está uma grande cidade de porto de mar que chamam Tanaçari (Tenassarim), onde há muitos mercadores mouros e gentios, que tratam toda a sorte de mercadorias; e, assim, tem muitas naus que navegam para Bengala, Malaca e outras muitas partes.
Ao sertão desta cidade nasce muito bem beijoim que é resina de árvores, a que os mouros chamam lobão; há duas qualidades dele, uma não lança cheiro senão depois de posta ao fogo, e a outra antes mesmo de posta ao fogo é mui boa e cheirosa, de que em Levante fazem o estorage (licor aromático).
A este porto vêem muitas naus de mouros de diversas partes, e trazem muito cobre, azougue, vermelhão, panos de grã, seda, veludos de Meca pintados, açafrão, coral branco enfiado e águas-rosadas (que de Meca e Adem trazem em uns pequenos barris de cobre estanhados, que vendem a p~eso com o próprio barril), muito anfião e panos Cambaia; e, tudo isto, tem grande valia neste reino de Anseão, e daqui levam os mercadores tõdas as cousas que há em Pegú.
Passando esta cidade de Tanaçari , ao longo da costa contra Malaca, está outro porto de mar deste próprio reino, que chamam Quedá, onde também há muitas naus grandes. Este lugar de mui grosso trato, e a ele vem cada ano naus de mouros de muitas partes. nele nasce muita e formosa pimenta, que dela levam para Malaca e China.
Tem mais este rei de Anseão nesta costa, entre Malaca e Tenaçari, outros dois ou três portos de mar que não sei os nomes, e, assim, muitas outras cidades grandes e vilas, e povoações dentro do sertão, de gentios, onde não entram nenhuns mouros, nem vivem, e, se algum lá vão negociar, não lhes consentem trazer armas.
Neste reino de Anseão há muito ouro que nele nasce e se apanha, principalmente no senhorio de Paam, que é além de Malaca contra China, que sempre doi deste reino. Agora é alevantado contra ele, e estã á obediência del-rei de Malaca.
Há nele também outro senhorio de gentios, que está à sua obediência, onde se ganha muito bem estanho, que levam para Malaca, onde se gasta e vende para muitas partes, ao qual senhorio chamam Caranguer.
Este rei de Anseão é mui grande senhor e gentio, como já disse, venerador dos ídolos, de quem te muitas casas de oração. Usa de muitos costumes diferentes dos outros gentios.
Andam nus, da cinta para baixo se cobrem com panos de algodão; alguns trazem umas roupetas de pano de seda. Têm em sua terra mantimentos, muitos arrozes e carnes de sua criação, outras monteses; têm muitos cavalos e facas, e muitos lebréus (cães de fila) e cães doutras maneiras, porque são grandes monteiros e caçadores.
No sertão desta terra contra a china há um reino de gentios que está à obediência deste de Anseão..."
José Martins
3 comments:
Primeiro comentario! boa sorte e boa continuação para este blog!
Abraço amigo,
Rita
Espero pela sua colaboração! Por aí tudo bem? Vá dando notícias para o meile...
Abraço (cultural) amigo
Jmartins
Eureka. É a opotunidade de tentar tecer mais do que velhas histórias, um renovar de aliança entre 2 povos e culturas - que só pelo conhecimento e estima se fundará. Tudo o que for possível contribuirei. Um antropologo. JFonseca
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