Monday, August 6, 2007

Fidalgos da Ìndia, Intriga e Pimenta

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Pelo interesse, histórico, que possa ter se transcreve o texto abaixo, parte de um documento/carta que se encontra na Torre do Tombo, incompleto, por deterioração de páginas.
Desconhece-se o autor da carta, enviada da Índia para o Rei D. Manuel I. Mas como nela se encontra designado o nome de Lopo Soares, teria sido escrita entre 1515 a 1518., altura que foi Governafor da Índia.
(Torre do Tombo, V.X. (Gav. XIX-XX, Maços 1-7) pags. 504 a 508, Centro E.H. Ultramarinos da Junta de Investigações Científicas do Ultramar, 1974 - Gulbenkian XVI. O texto é fiel, apenas para facilitar a leitura, foram algumas frases passadas à ortografia actual).

CARTA PARA EL-REI COM NOTÍCIAS DA ÍNDIA

"Até aqui não me estrevi de escrever a Vossa Alteza tão compridamente como eu desejava porque não ousava das cousas que se fazem contra serviço de Vossa (sic) Alteza e agora por ver passar tanto mal como se passa por descargo de minha consciência vos dou conta beijando-vos as mãos não dando conta a ninguém disto que por este medo não esperei a Vossa Alteza mais cedo e assim que faço saber a Vossa Alteza que Lopo Soares veio à Índia em hora minguada assim ele como quantos capitães com ele vieram e assim outros homens de valia porque o seu cuidado e o seu imaginar não é outro senão chatinar... "
"... e matam-nos e roubam quanto acham e disto dizem que o leva alguma fazenda e vai para Calecut ou para Canenor é espiado em tal maneira que como desaparece de Cochim logo é tomado destes macúas, porém, sempre ouvi dizer que semear trigo em ruim terra que não pode dar bom fruto... a Vossa Alteza e estes que dele esperam se gabou ele, que dera a cada um de ganho sete ou oito mil pardaos e ele é um grande ladrão descarado porque qualquer fazenda que ele pode achar de Vossa Alteza apanha-a e recolhe-a para si e com os favores que ele tem com os alvarás de Vossa Alteza com o dos vossos capitães com o proveito que faz ele isto porque nele não há fé nem lei senão quanto me parece que e agora mais gentio que dantes e por aqui saberá Vossa Alteza quanto ele é servidor de Vossa Alteza e mais Lopo Soares o requereu que fosse com ele a Ceilão e ele fugiu....
"...Mande Vossa Alteza olhar por isso e assim se Vossa Alteza a acha grande quebra de pimenta e por ser a primeira verde porque assim como a colhem deitam-na dous ou três dias ao sol e logo a pesam e esta quebra desta pimenta não foi senão depois que fizeram pazes com Calecut e bem pode Vossa Alteza quer ter boa pimenta defenda que nenhum homem com ela não trate só pena da cabeça e isto qualquer homem que seja porque todo o mais passa por preta e portanto Vossa Alteza não deve de dar a nenhum homem nenhum só quintal de pimenta para nenhuma parte que seja porque com o favor da pimenta que lhe Vossa Alteza dá para carregaram quanta querem e portanto Malaquias se gabou e amostrou que não vinha nem mandava por pimenta à Índia que lha levavam quanta ele queria que carregava as suas naus e depois de carregadas amostrou duas casas..."

"...e isso mesmo o feitor de Goa que se chama Rui Costa que agora vai por capitão duma das naus de André Afonso que quando veio a Portugal não trazia um vintém de seu e em dous anos que foi feitor de Goa dizem que leva vinte mil cruzados e assim que devia Vossa Alteza de lhe tomar a conta em que ganharam tanto dinheiro em tão pouco tempo assim ele como aos outros e Vossa Alteza mandasse castigar alguns deles se guardariam de meter as mãos na Fazenda de Vossa Senhoria...."

"...a Índia de arte que ela estava quando veio Lopo Soares mande fazer boa guerra e logo terá boa paz porque já ninguém não vos a modo que qaulquer cabrão que errar queimá-lo a assá-lo e cruxifica o que os outros que ficaram vos temerem e logo teres a Índia apaziguada que esta paz que Lopo Soares pôs a Índia neste ponto em que ela agora está porque nunca matou nem mandou matar mouro senão cristãos enforcar e cortar mãos..."

"...porque andam cá uns poucos fidalgos mamões que nunca viram nada nem nunca saíram das abas de suas mães e cá são capitães de naus e de galés e assim estes homens que Vossa Alteza houver de mandar sejam como disse que sejam de boa raça cavaleirosos e que folguem de ganhar honra e que tenam medo de Vossa Alteza lhe mandar corta a cabeça porque os fidalgos dizem todos que não vieram à Índia ganhar honra que com eles já nasceu senão dinheiro e assim não trazem o sentido senão em comprara e vender e como mandaram para a China e para Ormuz e para outras quaisquer partes..."

"...em Cochim disseram que aquela mercadoria que a compraram de seu dinheiro que el rei não tevera dinheiro para a comprar e assim que vo-la tornaram a vender sendo ela vossa e assim que com o dinheiro vosso dinheiro vos pagavam e guardavam o ganho para si e se alguma mercadoria vossa vem misturada com as das partes e se perde ou apodrece as das partes dizem que é da Vossa Alteza e assim tomam outra tanta da vossa são para si e fica a pôdre para vós e assim que nunca se perde nada das partes que quanto se perde tudo é de Vossa Alteza e o seu sempre fica...."
À MARGEM

Afonso de Albuquerque, além de um homem de grande valor é um guerreiro indomável. Depois de ter conquistado Ormuz em 1507, Goa em 1510, sonha e tornou em realidade a criação de um império português na Ásia. Em 1509 sucede, com o título de Governador da Índia, o vice-Rei D. Francisco de Almeida. O nome de Albuquerque foi respeitado e temido em todo o Oriente. Em Lisboa tem muitos inimigos que minam a honestidade do fidalgo ilustre.

D.Manuel I, deixa-se influnciar e aceita as mentiras, tira-lhe o Governo e entrega-o a Lopo Soares de Albergaria, o seu mais directo rival. Albuquerque não consegue sobreviver ao desgosto da humilhação e morre em 1515. Os fidalgos do tempo de sua governação, aqueles que não foram depostos das suas funções depois de ter falecido, continuaram a ser-lhe fieis, embora, como é óbvio, Lopo Soares de Albergaria, persegue-os e tolhe-lhes os movimentos. São homens de Albuquerque que escrevem cartas denunciantes a D. Manuel I, que pouco efeito, as acusações, produzem.
O Rei está com o Albergaria. No entanto este colhe os frutos saborosos das conquistas do grande general. Os interesses pela pátria portuguesa não cuidam os nobres fidalgos da Corte de D. Manuel I. A anarquia instalou-se por todo o Oriente e, "mais cuidavam dos seus ganhos pessoais", que a servidão a favor da monarquia que representa o Povo.

José Martins

Sunday, August 5, 2007

A Língua de Camões na Tailândia, Oriente e Índias Orientais

A Língua Portuguesa nos dias que correm é o meio de comunicação de cerca de 300 milhões de pessoas. E, consequentemente a ofícial nas instituições governamentais, do ensino nos países que os portugueses povoaram; colonizaram a partir do século XV e de quando se deu o início da expansão de Portugal no Mundo.
Expandiu-se progressivamente pelas costas ocidental e oriental de África, Índia, Costa do Coramandel, Ceilão, Reino do Pegú, Ilhas de Samatra, Molucas, Timor, Sudeste Asiático, China até ao Japão.
Portugal, país de reduzida dimensão geográfica, fundado em Guimarães por D. Afonso Henriques em 1228, estendeu-se até ao sul. Banhado a costa pelo Oceano Atlântico o privilegiou de ser a varanda da Europa. A grei composta de homens rudes e de almas generosas, nela surge um português ilustre: o Infante D. Henrique. Fundou a escola náutica de Sagres que o coloca, sem par ou contestação, numa figura humana de grande dimensão que transformou, completamente, o mundo, a partir do século XVI, graças à sua persitência.
O sonho do Infante foi concretizado após a sua morte: as Caravelas de Cristo já navegam em todos os aceanos da terra. Mercadores, missionários, do Padroado Português do Oriente, conforme os mareantes lusos largam as âncoras das caravelas nas baías e enseadas nas costas das novas terras descobertas, a civilização lusa, juntamente com a fé cristã, ficou e criou raízes.
Com isto, a língua de Camões, viria por mais de quatro séculos o meio de comunicação entre os países da Ásia, para o comércio, tratados entre países, relações bilaterais, missionarismo de crenças existentes na Europa, a religião católica e, em meados do século VII, o protestantismo.A língua portuguesa no final do século XVI é falada desde a Madeira, arquipélago descoberto em 1418, até ao remoto Japão. Os portugueses durante quase um século estão sós e senhores absolutos do comércio do Oriente. Foi num espaço de 100 anos que milhares de pessoas aprenderam a falar o português e foram assimilando frases de língua lusa às de suas raizes.
Em todos os portos da Ásia, onde os mercados e a comunidade luso-descendente se situam, a língua portuguesa ali está a servir de meio de ligação entre a França, Inglaterra e a Holanda, quando estes países começaram a descobrir o "filão" das riquezas do Oriente.
Era assim a importância da língua portuguesa em todo o continente asiático: S. Francisco de Xavier, o Apóstulo das Índias, ao serviço da coroa portuguesa, em 1545 pede a Lisboa que lhe mandem missionários a falar a língua portuguesa. A Holanda e o Bantão (Indonésia), em 1596 assinam o primeiro Tratado de Paz e Comércio, cujo texto é redigido na língua portuguesa. Dois anos depois, Maurício de Nassau, regente dos Países Baixos foi portador de uma Credencial que o acreditava como representante deste país.
Ainda neste mesmo ano (1598), os holandeses colocam uma inscrição pseudo-portuguesa na Ilha Maurícia. Um inglês, comerciante, em 1600 é chamado perante um Rei do Japão e foi na língua portugesa que se exprimiu ao monarca. Os barcos ao serviço dos holandeses, nas viagens para o Oriente, levam intérpretes que falavam o português. Frei Gaspar de S. Bernardino, em 1606, encontra no interior da Pérsia pessoas que falam o
português.
Mergui (Birmânia), onde viveu uma numerosa comunidade portuguesa e porto de grande movimento marítimo, a língua lusa era a corrente entre a população local e transitária. É assim a língua portuguesa o único meio de comunicação entre os povos da Ásia e o mundo ocidental. Ainda, em 1915, os missionários holandeses tinha por obrigação de ter conhecimento global do português nos territórios sob a tutela da Companhia das Índias Orientais.
Voltando ao início da introdução e depois de um século da língua portuguesa já estar firmada e enraizada por todos os países da Ásia, não pode ficar ignorado um estudo do Prof. David Lopes sobre a expansão da língua lusa na Ásia:
"(1609). As autoridades de Urtan (filha de Puloway, Samatra) mandaram a Keeling, mercador inglês que falava português, uma carta do almirante holandês em língua portuguesa. Muitos habitantes da ilha de Mohélia (uma das ilhas Comores) falavam português. (1620) Tratado de Paz e Comércio entre os dinamarqueses e o Princípe de Tanjor em espanhol-português e alemão. (1638). Os moradores de Comores, em frente de Ormuz, falavam português. (1639-1687). Em Batávia, as mulheres da sociedade e os escravos falavam português, segundo N. de Graaf. (1646-1656). Os reis de Ceilão correspondiam-se em português com os holandeses. (1647).
O Governador da Ilha Célebes falava bem português, segundo o P. Alexandre Rhodes. (1661). A língua portuguesa é falada por quase todos os habitantes da Índia, segundo Schouten. (1675). Pregação em língua portuguesa na cidade de Batávia. (1679-1681). Os Reis de Arcão correspondiam-se em português com o Governador-geral da Batávia. (1686). Os jesuitas franceses que iam para a China falavam português - "que era a língua mais concorrente no país" - com o Governador da Batávia, segundo o P. Tachard. (1669). Em Sião, os padres franceses pregavam em português, segundo o P. Tachard. (1698-1704). A Companhia Inglesa das Índias obrigava os ministros da religião a aprender o português. (1708). O português, língua corrente em Batávia, segundo Valentyn. (1708). Os pastores de língua malaia, em Batávia, apresentaram ao Governador-Geral e ao Conselho das Índias pedindo que o culto em língua malaia se fizesse na igreja portuguesa. (1709). Grunder, missionário de Trangambar, afirma a grande utilidade da língua portuguesa, para exercício do seu ministério. (1711). A língua portuguesa é uma espécie de língua franca em todos os portos da Índia, segundo Lockyer. (1718). Na história da princesa Bilibamba, o heroi príncipe chinês, fala português, segundo Biervillas. (1723). Indígenas das Ilha Nicobar que compreendiam o português. (1724 ou um pouco antes). A língua portuguesa é de uso corrente entre os europeus da Índia, segundo Hamilton"....(1)
A Inglaterra e a Holanda procuram por todos os meios e preço tomar o lugar aos portugueses na dominação co comércio do Oriente. Os ingleses preferem a Índia, enquanto os holandeses se estendem mais ao sul, navegando nas águas do mar de Andaman, passando o estreito de Malaca, conquista esta praça aos portugueses fixando-se em Samatra, Batávia e em todas as ilhas do arquipélago que nos dias de hoje são pertença da Indonésia.
A Dinamarca, com presen;a pouco significativa na Ásia, vai fazendo comércio e ocupam alguns portos da Costa do Coramandel, que não são mais que pontos de apoio logístico à sua navegação. A França deseja seguir as duas potências, europeias, e balançar esta força, já a dominar o comércio asiático, sem pretender envolver-se em lutas. O território asiático é enorme e ali há muito que comprar e vender.
Luis XIV o Grande, entronizado Rei de França, na idade do "beberão", aos cinco anos. Um Rei de tenra idade e influenciado pelos educadores da corte, fazem dele um monarca déspota, amante de batalhas e pelas lutas em que a França se envolveu, leva a nação a sofrer o revés da miséria. Luis XIV aspira colonizar o reino do Sião e com o propósito de a França ser o pêndulo da balança que pesavam as forças inglesas na Índia e as holandesas nas Índias Orientais.
São os missionários. jesuítas, das Missões Estrangeiras de Paris encarregadas de fazer a exploração da costa marítima do Sião; referenciar os pontos estratégicos em modos de espionagem, a coberto da religião católica e transmitirem-nos ao Rei Grande. Tal nunca viria acontecer dado que o povo siamês deu conta da conspiração; dá-se um terrível "massacre" e com isto a morte de missionários franceses já residentes em Ayuthaya (Aiutaá). Os que escaparam, são presos e outros metidos em embarcações, subiram o Rio Mekong e fixaram-se em Phnom Penh no Cambodja, mais adiante no Vietname e Laos que pouco depois passam a colonizar estes países.
A língua portuguesa não pode ser ignorada pelas três potências europeias da época. Sabem os seus governantes que dela se terá de servir a sua gente como meio de comunicação, entre os povos das novas terras ocupadas. Os novos ocupantes da Índia, Ceilão, Pegú, Malaca e a Indonésia, não seria com facilidade que poderiam assimilar as suas línguas às dezenas de línguas e dialetos falados no Oriente.
O português já estava a ser falado em termos correctos nos portos da Ásia e nos crioulos simplificados - indo-português e malaio-português - o usado nas trocas comerciais. São os franceses os que mais usam a língua portuguesa em toda a Ásia e, aconteceu no Reino do Sião, capital Ayuthaya, onde a língua portuguesa se tinha desenvolvido, enormemente, entre a comunidade luso-descendentes, no Ban Portuguete (Aldeia dos Portugueses), com uma população a rondar as três mil pessoas.
Na outra margem do rio Chao Prya (Chao Praiá) ou Mename, onde a comunidade portuguesa vive, situa-se o Campo Japonês, cuja população é composta pelos cristão perseguidos em Tenagashima e Negasaki pelo Imperador nipónico e seus samurais. Perseguidos que preferiram fugir do Japão que renegar a fé católica que Francisco Xavier tinha introduzido no país do sol nascente havia mais de um século e instalam-se junto à comunidade portuguesa onde o calor espiritual da religião católica os aconchegava.
Com os avôs, cristãos perseguidos, vive uma ilustre senhora, nascida no Campo Japonês e ficado orfão, a lusa-descendente Maria Guiomar. Senhora virtuosa e possuidora de generosidade que mais tarde viria a contrair matrimónio com o grego Constantino Falcão. Homem expedito e inteligente chegou a ocupar o lugar de primeiro-ministro na Corte do Rei Narai.
Os franceses servem-se de Falcão como intermediário entre eles e o Rei Narai. Os missionários encarregam-se de o converter à religião católica para que possa contrair matrimónio com Maria de Guiomar. O Falcão falava e escrevia correctamente o português. O Museu de Versalhes, em Paris, conserva nas suas gavetas numerosa correspondência, escrita na língua portuguesa, sobre tratados e outra referentes a negócios entre França e o Sião.
Porém, a grandeza da língua de Camões caiu no Oriente... igualmente aos impérios!
A língua portuguesa está a extinguir-se no Oriente. Desde o Norte de Moçambique e confortando a costa da Índia até ao Japão, apenas se fala (não em toda a população) em Goa, Timor e Macau. Nestes dois, últimos, territórios ficou como a oficial.
Até quando?
José Martins
(1) David Lopes, Antologia da Historiografia Portuguesa II - De Herculano aos Nossos Dias, página 138 - Publicações Europa-América